sábado, 20 de fevereiro de 2010

O tempo embebedou-se

de Cecílio Purcino

O tempo embebedou-se
Pegou uma garrafa de Château do vale no natal
E a tomou em três tempos.
Não deu outra e já estava cambaleando e tropeçando
Sobre tudo e a todos.
Ninguém reclamou de nada, pois o tempo é assim –
Sempre faz tudo e ninguém percebe.

Tempo depois ele estava comemorando a chegada do ano novo
Com duas taças de champagne Demoiselle
E uma de vinho seco.
Logo caiu de cama e ninguém viu mais falar do tempo.

Notícias e rumores só vieram dar-se do tempo no tempo de carnaval,
Quando o povo estava interessado em passar com o tempo,
Dançando, pulando, correndo e festando.
É a semana de carnaval e por isso o tempo é tão importante.

Sem perder tempo, o tempo novamente se embriagou,
Tomou toda cerveja que pode encontrar pela frente,
Comeu todos os petiscos e refinos que tinha direito
E entrou em coma.

O tempo parou no hospital da vida e ninguém mais via o tempo passar.
As pessoas só pensavam no tempo quando se lembravam
Das diversões, das brincadeiras e das emoções.

Não levou muito tempo e o tempo acordou, e dessa vez mais vivo.
Conforme o tempo foi passando pelas ruas, bairros, cidades e estados,
Ele foi deixando sua marca.
Era paixão desesperada, um sorriso que ele afagava,
A dama desiludida, o homem que prosperava,
A razão amargurada, o amor que aparecia, a morte que vingava
No barco que gemia, era a casa findada, era a festa arredia,
Era o encontro marcado, era a criança que nascia, no namoro ajeitado,
Na saudade que batia, eram parentes distantes, que tão pouco ele sabia,
Era o tempo brincando, bebedeira arredia.

Mas não deu muito tempo, e o tempo voltou
A trabalhar com seu relógio futurístico.
E o tempo trabalha...
Trabalha tanto que cansa
E depois descansa nas férias do meio do ano.

No Brasil, o tempo tem asas, ele voa, passa
Sem ninguém dar-se contas dele.
Ele passara por mim agora e nem percebi.

Bom, digamos que o tempo tem alguns gostos estranhos.
O tempo passa nos calçadões e corteja as mulheres,
E cumprimentam os homens, que logo cedo
Se embriagando de cappuccino –
Bebida fina que o tempo trouxe para satisfazer
As vontades desses que esqueceram de acordar para a vida.

O tempo não trouxe somente o cappuccino,
Ele trouxe as roupas, os chapéus, os charutos, os colares,
Os brincos, as maquiagens, as gargantilhas,
As penas plumagens, as blusas, as camisetas,
Camisa de botão, tecidos importados.

Trouxe também, as músicas, as poesias, os instrumentos,
Os copos, as xícaras, o plástico, o tecido biodegradável,
O ferro o aço, o lápis apontável, a comunicação, a decoração,
A impressão automática, a imagem na ação.

O tempo trouxe tudo, patenteou seu nome
Em cada exemplar e deu para seus filhos usarem.

O tempo é dono de tudo,
E apegado coisa nenhuma.
Ele gosta mesmo é de se embriagar
E ver-se passar pelo espelho da vida.

E novamente o tempo viaja, voa, passeia,
Caminha, com a minha vida,
E cassua, com a sua.
E ele passa agora cumprimentando
Maria e as crianças pela 12 de outubro
E rezando pelos mortos no cemitério, 2 de novembro.
E agora o tempo está novamente comemorando o natal,
E nem dei por mim que o tempo já tinha passado,
E que ele já iria se embriagar de novo e se esbarrar em mim,
Em ti e em tudo e a todos que puder para mostrar
Que ele nunca para, e que ele esta vivo.

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