quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Quem eu sou?

de Cecílio Purcino

Quem eu sou? Eu, quem sou?
Talvez eu seja alguém que sou
Ou talvez sou quem eu seja ser.
Mas eu, o que sou?

Definir-me quem sou, é resolver problemas universais,
Orbitas complexas, corrigir triângulos e retângulos,
Esferas circulares do inconstante ser
Pensante que eu sou.

Mas, quem sou eu?
Pensava eu que sabia,
Pensava talvez que eu era uma criatura
Que atura dentro de um corpo o volume do vazio,
Feito apenas de imagem e ação, de cálcio e carbono,
De átomos atônitos, elétrons quantificados,
Pele, ossos, carnes, unhas, e as mãos
A cabeça para pensar no que sou eu.

O que é o eu?
Duas vogais que meu intelecto precário babuça,
Codificações catalogadas pelo amigo tempo,
Expostas durante a vida para identificar-me
Com quem sou na simples e translúcida
Singularidade da língua portuguesa, o eu.

Decidir quem eu sou é determinar sonhos,
Idéias, instantes dos arquétipos inconstantes das constantes
Dos seres que eu tento ser, e que nem sempre são.

E eu cogito! Penso logo existo,
Mas todos os dias eu penso, escrevo e me remeto a mim
E adentro de mim somente o eu,
Ásperos, volátil e inexistente.
Não sou o que eu penso,
E nem penso o que eu sou.
Eu não sou eu! Não sou nada! Ou talvez seja alguma coisa,
Ou coisa de algum eu por ai andante, pensante.

Quem eu devo ser?
Aliado do sistema corrupto,
Modelos perfeitos de manipulação precária da mente coletiva,
Ardorno, Horkheimer,
Água e sal dentro dessa massa falante, errante, corrupta.

Ah, eu que sou mais e mais, cada vez mais adjunto dessa
Razão que rumina o pobre capim, as plântulas e as notas verdes cem que é,
Eu sou! Sou quem mereço ser dentro de nós, de vós, deles e delas.
Sou vós! Quem e o que mais eu posso ser a não ser vós?

Faço parte dessa vida diária, indiferente, taciturna, maquiada,
Mundo sem leis gravitacionais, translação e rotação insuficiente,
E flutuante pelas ações, sem reações,
Somente as bolsas de valores.

Mais eu sou! Sou celulose imprensada,
Com alguns rabiscos de tinta nanquim,
Texto feito apenas por mim, e mais ninguém.
Sou escritos vivos, andantes, arquétipos pulsantes,
Criado por deus sabe-se lá o que é mais eu.

Ser o poema sem fim, a força erronia de se escrever,
A tentativa de ser o que não sou
Em folhas brancas e árvores verdes
Em papel machê e vegetal, é o que eu sou.

Ser literatura contemporânea é o que faz eu ser é,
E eu sou, e agora me sinto sendo,
Acendo-me, escrevendo.
E depois de sentir-me o que eu sou,
Sabendo que eu nada era antes das palavras.
Pergunto para vós que soa dentro aqui do eu.
Quem é vós?

5 de Janeiro de 2010.

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